*Rogério Silva
A dona Maria da Conceição tinha esse nome porque nasceu no dia 8
de dezembro. Uma bênção para a família. Mas ninguém a chamava assim. Ela era a
filha mais nova do seu Florisbal Pinto. Logo, era a mocinha da família, a
mocinha filha do seu Florisbal Pinto. Não deu outra. Virou Moça Pinto. Maria da
Conceição só nas assinaturas e na hora de mostrar a carteira de identidade.
Debruçada sobre o parapeito da janela do velho casarão da longínqua cidadela,
ela via a vida passar sendo cumprimentada por todos. “Moça Pinto, bom dia!”,
“Como vai, Moça Pinto, recomendações a seu pai e a senhora sua mãe”. No início
se incomodava. Mas se acostumou. E mesmo na altura de seus 80 anos de vida e
experiência, ainda era uma Moça. A Moça Pinto.
Viveu sua adolescência nos meados do século passado, período
em que o Brasil abria os olhos para o mundo. Era a chegada da televisão. Reza a
lenda que Hebe Camargo e Assis Chateaubriand quebraram a primeira câmera na tal
inauguração com o ato solene do estouro da champanhe. Mitos de lado, o fato é
que essa é uma história ainda sem fim. Pelo menos até os dias de hoje.
A moça do interior, a gente da capital, a tranquilidade de cá, o
progresso de lá. A comunicação encurta distâncias e, se aliada à tecnologia,
vrupt, simplesmente voa. E o que é a comunicação senão o ato de narrar coisas,
contar histórias, causos? Lembra um pouco a vizinha fofoqueira que dá conta da
vinda do quarteirão inteiro. Moça Pinto e a Televisão Brasileira me remetem a
focas e dromedários. No jargão das redações, foca é o rapazola ainda sem pelo
no rosto, com óculos na ponta do nariz e caderninho de anotações à mão. É o
aprendiz - e quem não foi um dia! Idealista por natureza, sonha e
chega a ter certeza que vai consertar o mundo. Em geral é denominado de
"o estagiário", a fungar no cangote dos mais velhos de
carteira. O combustível da labuta. Nada como um jovem a fim de mostrar
serviço, deixando colegas na "saia justa". O foca é ansioso,
exasperado, gosta de sair na frente, de levantar a mão primeiro com a resposta
na ponta da língua. "Eu sei, eu vi, eu posso, eu quero, eu... eu...
eu...". No outro canto está o quase arqueado senhor, que já foi foca
um dia, hoje pode facilmente ser identificado como um dromedário. Comedido,
introspectivo. Às vezes, até calado demais. Diz-se de si: Tenho dois ouvidos e
uma boca. Devo ouvir mais do que falar. O foca se antecipa. O dromedário retém.
O foca atropela. O dromedário se contém. O foca é alfa. O dromedário é ômega.
Pelas redações afora, pelo mundo corporativo, que não sejamos
jamais nem um e nem outro exclusivamente. Nem Moça Pinto e nem Assis
Chateaubriand. Nem tanto ao céu e nem tanto ao mar. Não somente foca, muito
menos apenas dromedário.
Comunicar é um pouco de tudo isso a que podemos chamar de
EQUILÍBRIO. A comunicação no Brasil, nascida livre, experimentou a
repressão e se reinventou no pós-militar como um ex-presidiário, tonto, sem
saber o que fazer com a liberdade. Permaneceu engessada por um tempo e começou
a se soltar de dez, quinze anos pra cá. Hoje tem responsabilidade com bom
humor, seriedade e sutileza com curiosidade e destreza. Vê-se, é claro,
em situações delicadas, sobretudo quando entram ingredientes como política
e poder.
E vamos em frente, nos equilibrando nessa corda, com a
inteligência de quem precisa de muito jogo de cintura, nesse jogo de palavras.
Até semana que vem!
(*) Rogério Silva tem 41 anos, é jornalista e
administrador de empresas. Tem MBA em Gestão Executiva e Empreendedora, com
extensão em liderança. Desde 2007 dirige as áreas de infraestrutura midiática e
jornalismo da Rádio Educadora Jovem Pan e TV Paranaíba/Record, em Uberlândia,
Minas Gerais - Colunista Semanal do Blog www.administrandohoje.blogspot.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário