*Rogério Silva
Chego por volta das nove da manhã
à minha sala e já estão sobre a mesa o principal jornal impresso local e uma
edição da Folha de São Paulo. Mais cedo, entre o café da manhã e a saída de
casa, passei os olhos pelas principais notícias do dia em dois portais que
tenho hábito visitar. No carro, mais informações no rádio AM, vício recente
adquirido em Uberlândia. Sem contar os primeiros telejornais do dia, em que
bastam as manchetes da escalada para saber que as coisas não vão bem.
Descaso com o dinheiro público, desvio
de recursos do Estado, chuva de corrupção, câmeras escondidas que flagram
negociatas com figuras asquerosas, hospitais superlotados, crimes em série,
dentista incendiada em assalto brutal, os zumbis do crack debaixo de viadutos,
perambulando em vias movimentadas das capitais, o nojo em Brasília, as estradas
que nunca são concluídas, o trem bala que nos custará, quem sabe, 50 anos de juros
e, quem sabe, ligará coisa alguma a lugar nenhum.
Parem! Eu quero descer. Desliga
tudo. Desliga o mundo.
Tem momentos em que dá vontade de
não saber nada, jogar fora os telefones, os aparelhos de tv, computadores,
cancelar as assinaturas de jornais, revistas. Passar longe da notícia e tentar
imaginar-se no mundo de Alice.
A alienação que alimenta a alma.
Sem metáforas. Estamos sendo empurrados para junto do inimigo e só há duas opções:
Enfrentá-lo ou render-se.
Uma grande amiga minha encontrou
uma terceira via: Contornar a situação e viver à margem da realidade. Há cerca
de 5 anos ela decidiu alienar-se. Tem uma tv no quarto para assistir a novelas
e filmes. Invariavelmente, recorre ao videoclube e entope seu fim de semana de
comédias românticas e séries americanas engraçadinhas. Dedica seu tempo de
trabalho integralmente à vida acadêmica, onde mergulha em teorias e estuda o
mundo social dos séculos passados. Um pouco de Revolução Francesa, um pouco de
Revolução Industrial, o regime militar dos anos de ferro no Brasil, o engodo da
Nova República, planos Cruzado, Collor e – para por aí! Já está real demais.
Daqui a pouco pintam FHC e Lula, e para cair em Dilma e a loucura de hoje é um
pulo.
Sair do real e entrar no
imaginário é fácil. E nem precisa de LSD. Basta que você se proponha a isso. E,
sinceramente, estou pensando nessa possibilidade faz tempo. É como se eu
quisesse antecipar a aposentadoria, mas sem parar de trabalhar. O que me
atormenta não é o trabalho, mas a agressiva realidade a que estão nos
submetendo: Pobres e ricos, justos ou desonestos, fracos, fortes, intelectuais
ou trabalhadores braçais. Estamos todos no mesmo balaio.
Às vezes penso que somos cobaias.
Tem um Deus de jaleco branco, bem grande lá do alto, pegando cada um de nós e
trocando de aquários toda noite. Nas caixas de vidro experimentamos pressão,
sufoco, uma leve brisa e mais pressão, teste disso, daquilo. Como diria Cazuza,
“…nós somos as cobaias de Deus”.
E se eu fugisse dos experimentos
e dissesse para o grande cientista: “Por favor, isole-me, mande-me para o mundo
maravilhoso onde vive Alice, distante de tudo o que me deprime, de tudo que
angustia”. E se ele deixasse? E se ele topasse a proposta?
No mundo maravilhoso de Alice
deve haver outros obstáculos, diferentes tormentas, um novo sabor de desafio.
Do lado de lá, a ficção pode nos levar à loucura e nos fazer até sentir saudade
do lado de cá. Como saber antes de tentar? Como saber? Como?
(*)
Rogério Silva tem 41 anos, é jornalista e administrador de empresas. Tem MBA em
Gestão Executiva e Empreendedora, com extensão em liderança. Desde 2007 dirige
as áreas de infraestrutura midiática e jornalismo da Rádio Educadora Jovem Pan
e TV Paranaíba/Record, em Uberlândia, Minas Gerais - Colunista Semanal
do Blogwww.administrandohoje.blogspot.com.br
Maravilhoso! Há tempos não escuto notícias e não vejo nenhum tipo de jornal, justamente, para não sobrecarregar a minha mente já tão estressada. Assalto na porta de casa, doenças em amigos queridos, filhos adolescentes... Enfim. Também quero viver no mundo de Alice, mas gostaria de levar algumas coisitas desse mundo pra mim: meus amores, óbvio; meus livros, óbvio 2; alguns filmes que nunca me canso de assistir e The Big Bang Theory, o meu enlatado americano preferido. Parabéns pelo texto, meu amigo Rogério! Envia pro meu email, por favor? E também esse meu comentário? Beijos de coraçõeszinhos a la ALICE!
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