13 março 2013

Sobre focas e dromedários



*Rogério Silva
A dona Maria da Conceição tinha esse nome porque nasceu no dia 8 de dezembro. Uma bênção para a família. Mas ninguém a chamava assim. Ela era a filha mais nova do seu Florisbal Pinto. Logo, era a mocinha da família, a mocinha filha do seu Florisbal Pinto. Não deu outra. Virou Moça Pinto. Maria da Conceição só nas assinaturas e na hora de mostrar a carteira de identidade. Debruçada sobre o parapeito da janela do velho casarão da longínqua cidadela, ela via a vida passar sendo cumprimentada por todos. “Moça Pinto, bom dia!”, “Como vai, Moça Pinto, recomendações a seu pai e a senhora sua mãe”. No início se incomodava. Mas se acostumou. E mesmo na altura de seus 80 anos de vida e experiência, ainda era uma Moça. A Moça Pinto.
Viveu sua adolescência nos meados do século passado, período em que o Brasil abria os olhos para o mundo. Era a chegada da televisão. Reza a lenda que Hebe Camargo e Assis Chateaubriand quebraram a primeira câmera na tal inauguração com o ato solene do estouro da champanhe. Mitos de lado, o fato é que essa é uma história ainda sem fim. Pelo menos até os dias de hoje.
A moça do interior, a gente da capital, a tranquilidade de cá, o progresso de lá. A comunicação encurta distâncias e, se aliada à tecnologia, vrupt, simplesmente voa. E o que é a comunicação senão o ato de narrar coisas, contar histórias, causos? Lembra um pouco a vizinha fofoqueira que dá conta da vinda do quarteirão inteiro. Moça Pinto e a Televisão Brasileira me remetem a focas e dromedários. No jargão das redações, foca é o rapazola ainda sem pelo no rosto, com óculos na ponta do nariz e caderninho de anotações à mão. É o aprendiz - e quem não foi um dia! Idealista por natureza, sonha e chega a ter certeza que vai consertar o mundo. Em geral é denominado de "o estagiário", a fungar no cangote dos mais velhos de carteira. O combustível da labuta. Nada como um jovem a fim de mostrar serviço, deixando colegas na "saia justa". O foca é ansioso, exasperado, gosta de sair na frente, de levantar a mão primeiro com a resposta na ponta da língua. "Eu sei, eu vi, eu posso, eu quero, eu... eu... eu...". No outro canto está o quase arqueado senhor, que já foi foca um dia, hoje pode facilmente ser identificado como um dromedário. Comedido, introspectivo. Às vezes, até calado demais. Diz-se de si: Tenho dois ouvidos e uma boca. Devo ouvir mais do que falar. O foca se antecipa. O dromedário retém. O foca atropela. O dromedário se contém. O foca é alfa. O dromedário é ômega.
Pelas redações afora, pelo mundo corporativo, que não sejamos jamais nem um e nem outro exclusivamente. Nem Moça Pinto e nem Assis Chateaubriand. Nem tanto ao céu e nem tanto ao mar. Não somente foca, muito menos apenas dromedário. 
Comunicar é um pouco de tudo isso a que podemos chamar de EQUILÍBRIO. A comunicação no Brasil, nascida livre, experimentou a repressão e se reinventou no pós-militar como um ex-presidiário, tonto, sem saber o que fazer com a liberdade. Permaneceu engessada por um tempo e começou a se soltar de dez, quinze anos pra cá. Hoje tem responsabilidade com bom humor, seriedade e sutileza com curiosidade e destreza. Vê-se, é claro, em situações delicadas, sobretudo quando entram ingredientes como política e poder. 
E vamos em frente, nos equilibrando nessa corda, com a inteligência de quem precisa de muito jogo de cintura, nesse jogo de palavras.
Até semana que vem!


(*) Rogério Silva tem 41 anos, é jornalista e administrador de empresas. Tem MBA em Gestão Executiva e Empreendedora, com extensão em liderança. Desde 2007 dirige as áreas de infraestrutura midiática e jornalismo da Rádio Educadora Jovem Pan e TV Paranaíba/Record, em Uberlândia, Minas Gerais - Colunista Semanal do Blog www.administrandohoje.blogspot.com.br
 

Nenhum comentário:

Postar um comentário